terça-feira, 23 de setembro de 2014

MENSAGEM AOS EX-SEMINARISTAS [Roda Viva]




A GENTE ÀS VEZES JÁ NÃO PODE E NEM CONSEGUE SER A GENTE

Pois é, pessoal, o nosso Encontro desse ano não conseguimos realizar. Fica uma ponta de frustração e um vazio.

A gente, não mais consegue ser a gente. O tempo passou, nossos caminhos foram longos e fortuitos.

A velhice nos torna dependentes de nós mesmos e de nossos amigos, familiares e de nossas vidas que construímos durante esse longo tempo. Não conseguimos mais ter uma vida própria, nem que seja por um dia ou dois.

Os compromissos se avolumam através de nossa própria consciência ou inconsciência e chegamos aonde estamos, e o presente se adianta e nos convoca a preterir um passado. Passado esse que se perde à medida que nos esquecemos verdadeiramente dele.

Alie-se a isso nossa própria fragilidade física e emocional. Doenças nossas, de nossos familiares e amigos que nos impedem de estarmos presentes. E ainda o casamento da filha de nosso sobrinho, o batizado do filho do amigo do filho... E isso nos prende a esse elo do qual não podemos nos desvencilhar nem que seja por um dia ou dois por ano.

Mas o Seminário está lá. Incólume. Mesmo se o nosso refeitório, camas e corredor já não mais existissem. Mas ainda existem. E nos chama sempre ao recôndito de suas lembranças. Onde passávamos alegres para a capela pra oração da manhã ou do último recreio após o jantar e recolhermos às nossas caminhas com o armário do lado. Tudo está lá, mesmo se não estivesse fisicamente.

Hoje não temos tempo prá nós mesmos e as lembranças são quimeras. Muitos de nós, que não compareceram em nenhum dos encontros, parecem preferir que fique assim, uma foto não tirada que permanecerá eternamente pendurada na sala de nosso coração. Uma sala vazia, povoada somente com nossos olhos.

Respeitamos e compreendemos, mas lamentamos.

Padre Chamel na altura de seus oitenta e tantos anos, com todos seus compromissos e pseuda-fragilidade esperou todos esses anos para que reunisse seus meninos e tudo que propusemos de data, de trabalho, de local, de organização do encontro foi o mais entusiasta e sempre arranja um tempo para ver e estar com os seus meninos.

Onde foi parar nossa vontade própria ou a falta dela?

Como disse, é tudo muito natural e compreensível; que as intempéries da vida nos impeça de estarmos presentes. Cada um, TENHO A CERTEZA, gostaria de estar lá, ou aqui, ou em qualquer lugar onde estivéssemos todos.

Me veio à mente uma canção do Chico Buarque)RODA VIVA) que talvez resuma em versos tudo isso que eu disse aí em cima.

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RODA VIVA

Chico Buarque

Tem dias que a gente se sente
Como quem partiu ou morreu
A gente estancou de repente
Ou foi o mundo então que cresceu


A gente quer ter voz ativa
No nosso destino mandar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega o destino pra lá

A gente vai contra a corrente
Até não poder resistir
Na volta do barco é que sente
O quanto deixou de cumprir


Faz tempo que a gente cultiva
A mais linda roseira que há
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a roseira pra lá

A roda da saia, a mulata
Não quer mais rodar, não senhor
Não posso fazer serenata
A roda de samba acabou


A gente toma a iniciativa
Viola na rua, a cantar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a viola pra lá

O samba, a viola, a roseira
Um dia a fogueira queimou
Foi tudo ilusão passageira
Que a brisa primeira levou


No peito a saudade cativa
Faz força pro tempo parar
Mas eis que chega a roda-viva
E carrega a saudade pra lá


Roda mundo, roda-gigante
Rodamoinho, roda pião
O tempo rodou num instante
Nas voltas do meu coração



Ano que vem, se o mundo não estancar de repente

Se nosso destino não for carregado prá lá

Se nosso barco resistir à corrente

Se nossa roseira não for desfolhada

Se nos deixarem fazer a serenata

Se não calarem a nossa viola

Se a brisa primeira não levar nossa ilusão

Estaremos o ano que vem tentando de novo

Nos reunirmos de coração e presença para

Mais um Grande Encontro

Abraços a todos

Eduardo Henriques

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