Jean Meslier, o primeiro padre ateu

Por volta de 1762, Voltaire fala com os seus correspondentes a respeito dum livro muito raro intitulado, Extratos dos Sentimentos de Jean Meslier, também conhecido como As Memórias de Meslier.
Nascido em 1678, Meslier ordenou-se padre e foi mandado para a pequena cidade de Etrepigny na região francesa de Champagne onde morreu em 1729.
Pois é, este pacato pároco, nas suas memórias relata que toda religião é falsa e que os fatos bíblicos são contrários à razão e as violências sociais estabelecidas a partir dos representantes de Deus.
Deste modo, este simples sacerdote do interior apresenta uma filosofia de caráter nitidamente materialista. 
Suas memórias foram muito debatidas no século XVIII e esquecidas nos séculos seguintes.
Com medo de represálias, Meslier escreveu suas memórias sozinho para serem divulgadas depois de sua morte.
Desta maneira, Meslier começa pedindo perdão pelas mentiras que ele pregou inventadas para fins políticos. Ele denuncia a falsidade do princípio da religião, ou seja, a ideia de Deus.
Sendo assim, ele divide o seu trabalho em 10 provas,
1a.) Todas as religiões são invenções humanas e o Deus de Abraão, Isaac e Jacó não é mais verdadeiro que os deuses greco-romanos;
2a.) A Fé em primeiro lugar é cega, sem fundamentos e seguros. Ter fé é crer sem raciocinar, ou seja, é uma ilusão. Está aí a razão das guerras religiosas sangrentas;
3a./4a.) Crítica do Antigo e Novo testamento, englobando os sacrifícios a Deus e as profecias que nunca ocorreram;
5a.) Demonstra a falsidade da doutrina e da moral cristã. Pra ele, Cristo não passava de um homem como os outros. Segundo ele, a moral cristã é contrária à natureza. E que a Igreja Cristã em seu seio sempre sustentou um clero ocioso e muito rico;
6a.) Meslier propõe no lugar dos princípios opressores da religião cristã, uma sociedade na propriedade coletiva dos bens;
7a./8a.) As duas últimas provas são puramente filosóficas, ou seja, argumentos contra a existência de Deus e a Criação do Mundo feita por ele. Concluindo que o ser material é o único e verdadeiro ser. E que a alma é matéria pura.
Meslier nos deixa claro de que o Cristianismo sempre foi em prol dos soberanos e do clero. O Céu tão prometido não passa de uma pura ilusão. Pra ele a verdadeira redenção é a liberdade da escravidão, da idolatria, da superstição e da tirania.
Na verdade, o projeto revolucionário de Meslier é a emancipação de todos os povos do mundo. Para atingir este ponto máximo, ele sonha com uma Igreja ateia e sem dogmas, onde os próprios padres continuarão o seu ofício como guias sábios, dando ênfase às coisas da Terra e não ás do Céu, mostrando que a felicidade é aqui e não depois e que o amor está acima de tudo.

Anibal Werneckfreitas, em 15/08/2019.