Projeto
música e literatura
Monsenhor
gerardo naves
1. Eu, Anibal Werneck de
Freitas, nasci no dia 19 de julho de 1948, na cidade de Recreio(mg), filho de
Antônio Higyno de Freitas e Wanda Ferraz Werneck de Freitas e tenho como
irmãos, Marco Antônio, Janine, Antônio Carlos e Ana Luísa. Sou formado em
história e professor aposentado.
2. Minha avó Luiza Ferraz
era muito religiosa e assim, me colocou como coroinha do pe. Celso Campos Sales,
na paróquia do Menino-Deus, hoje Nossa Senhora Aparecida. Deste modo, fui
encaminhado para o Seminário Diocesano Nossa Senhora Aparecida de Leopoldina(MG).
3. Estudei de 1961 até
1965 neste educadário e o reitor era o Pe. Antonio José Chamel, atualmente monsenhor.
4. Rotina do seminário: Todos os dias, acordávamos bem cedinho, sob as badaladas
do sino, dadas pelo Reitor Pe. Antônio Chamel, as quais nos faziam,
imediatamente pular da cama, escovar os dentes, lavar o rosto, vestir a batina
e, em fila, caminhar até à capela para assistir a Santa Missa, em jejum. No
início, devido à falta de costume, alguns chegavam a desmaiar durante a
cerimônia.
Ainda de batina,
depois da missa, íamos para o refeitório, tomar o café da manhã.
Após o café
matinal, havia um pequeno recreio e, até na hora do almoço, um estudo e quatro
aulas.
Durante o almoço,
podíamos conversar, mas primeiro tínhamos que ouvir um trecho do Novo
Testamento (cada dia era marcado um pra ler),
Na parte da tarde, mais um estudo, treino de futebol e banho gelado (não tinha
chuveiro elétrico).
Já no jantar, não
podíamos conversar, e sim, ouvir a leitura da Bíblia e a de um livro escolhido.
Lembro-me muito bem de um, O Cão dos Baskerville, de Sir Arthur Conan Doyle, o
autor do famoso detetive, Sherlock Holmes e seu auxiliar, Dr. Watson.
Pois bem, depois do
jantar, um longo recreio entrava noite a dentro. Eu aproveitava o tempo, pra
ouvir a minha orquestra preferida, a do Ray Conniff,
principalmente as músicas, Besame Mucho’ e ‘Aquarela do Brasil’.
Findo o recreio, um
outro estudo nos esperava.
Deste modo, pra fechar o dia, íamos pra capela, meditar e rezar a oração da
noite.
Às 21 horas, já estávamos todos no dormitório.
5. O currículo escolar do
seminário abordava as seguintes matérias: português, matemática, ciência,
história, geografia, artes, latim, francês, inglês e educação física, regida
pelo Pe. Antônio Chamel. Os professores que eu me lembro foram: Pe. Antônio Chamel
(latim), Átila (matemática), Oiliam José (história), Waldir (matemática),
Hudson (inglês), Cidinha (português), dona Limpinha (geografia), dona Dionéia
(francês), dona Carmen da Silva Xavier, descendente de Tiradentes (artes).
6. Leopoldina era uma
cidade pacata, a Rio-Bahia não era muito movimentada, a rua principal,
Cotegipe, abarcava a maior parte do comércio e a rodoviária não existia ainda,
os ônibus paravam na calçada do cinema em frente ao jardim. Conhecida como a Atenas
mineira, devido aos bons colégios que tinha, como o Botelho Reis.
7. Ultimamente fizemos uns
encontros dos ex-seminaristas, só com a presença do monsenhor Chamel, porque os
demais professores morreram e isto criou um vazio muito grande.
As
lembranças foram muitas, primeiro, dos colegas, depois das atividades no campo
da música, onde eu criei o trio uirapuru que apresentava no grêmio literário.
Em seguida, dos desenhos em quadrinhos do meu personagem, Tucanlino. Pra
completar, do Cônego Gerardo Naves, um artista completo, com o qual tive uma
experiência muito grande como tenorino, cantando O Sole Mio, Una Furtiva Lagrima
e outras do cancioneiro italiano. Além disso, fui protagonista da sua opereta, Os
Duendes Da Montanha, além de participar do coral regido por ele, cantando
músicas do nosso folclore, de sua autoria e italianas como Va Pensiero.
o Coral do Seminário N. S. Aparecida, Festival de Vozes da Juventude,
era regido pelo Cônego Gerardo Naves, contendo anexo o Programa das músicas, divido
em três partes: Música Religiosa, Operística e de
Câmera e Folclórica.
8. As aulas de canto eram administradas através do coral, nele o Pe. José Machado
e depois o Cônego Naves regiam o coral e assim, separavam os desafinados dos
afinados. Os desafinados não eram obrigados a frequentar as aulas de canto.
9. O Monsenhor Gerardo Naves nasceu em São Sebastião do Paraíso em
03/04/1912 e veio para Leopoldina em 1963. Foi Cura da Catedral desde 1965 e
Coordenador da Pastoral da Diocesana desde 1974. Fez seus estudos de
Humanidades e Filosofia no Seminário de Guaxupé, Teologia no de Belo Horizonte
e, ainda neste último, especialização em Psicologia e Sociologia.
Lecionou na
C.A.D.E.S. e no Colégio São Luiz de Guaxupé, no Colégio Estadual São José do
Rio Pardo, no Seminário Diocesano Nossa Senhora Aparecida, de Leopoldina e na
Faculdade Santa Marcelina, de Muriaé. Foi professor de Língua Portuguesa,
Francês, Literatura Francesa e de Moral e Cívica, chegou também a dar aula de
Latim e Francês no Seminário N. S. Aparecida, de Leopoldina, cujas línguas
falava fluentemente e aposentou-se no Colégio Estadual Botelho Reis, onde
trabalhou no período de 1963 a 1982.
Gerardo Naves foi,
também, Capelão da Marinha de Pesca em Arrais das baias de Ilha Grande,
Sepetiba e Recôncavos.
Músico, teatrólogo,
poeta e prosador, suas obras eram assinadas pelo pseudônimo, Alberto M. Alves,
minha mãe Wanda, segundo ela, chegou a ouvir uma novela dele pelo rádio.
Certa vez, eu
estava no Clube de Leopoldina com o Naves e de repente apareceu uma dupla
sertaneja com um LP nas mãos, estavam programando um show no clube, deste modo,
o cônego aproximou-se deles e pediu para ver um disco da dupla, na mesma hora,
ele [o Cônego Naves], me mostrou a segunda capa do LP e na relação das músicas
gravadas estavam duas com a assinatura, Alberto M. Alves, ele sorriu pra mim,
entregou o disco à dupla e em seguida, simplesmente, os agradeceu. Outra feita
foi em Ubá(MG), estávamos caminhando para uma igreja, eu, o Naves e alguns
seminaristas, e dentro do templo, um coral estava ensaiando uma música para a
missa. Pois é, o Cônego Naves simplesmente virou pra gente e disse: - Esta
música fui eu que compus. Assim era o grande artista que ele foi.
Eu já não estava
mais no seminário quando, certa vez, recebi a notícia de que ele tinha
ganhado cinco prêmios na Europa, onze na América do Sul e oito no Brasil.
Ele é o autor do
Hino de Leopoldina (Letra e Música).
Em 1954, ganhou o
concurso de música erudita do Conservatório de Paris; e, em 1982, comemorando o
20º aniversário daquele concurso, foram convidados 20 mestres da música
internacional para julgarem as 19 peças anteriormente vencedoras, saindo-se
vitoriosa a composição do Monsenhor Gerardo Naves. Além de tudo isso, como
escritor, publicou prosas e versos na ANTOLOGIA LEOPOLDINENSE de 1982.
Segundo o
Necrológico da Diocese de Leopoldina(MG), o Monsenhor Gerardo Naves faleceu em
23 de maio de 1985, na cidade de São Sebastião do Paraíso(MG), justamente onde
nasceu, aos 73 anos.
10.
GERARDO COM “R”
Na foto, eu
[Anibal Werneck de Freitas]
conversando com
o Monsenhor
Gerardo Naves na
sala do Palácio
Episcopal da
Diocese de Leopoldina/MG.,
o assunto não
podia ser outro, música.
Isto aconteceu
no ano de 1980.
Eu já não estava
mais no seminário
e, nesta ocasião
o Monsenhor me fez
uma proposta de
voltar a cantar as
canções
napolitanas que ele
magistralmente
me acompanhava ao piano,
hoje me arrependo
de não ter aceitado
a sua proposta.
Parece-me que ele não gostou.
O nosso
companheiro Armando Mercadante nos enviou esta preciosidade extraída no blog do José do Carmo. Assim, de
grão em grão vamos fazendo o pão, obrigado companheiro, Anibal.
A conversa de
hoje vem lá dos anos setenta e lembra um personagem muito querido em minha
terra, o saudoso Cônego Naves. Falecido em 1985, foi Cura da Catedral de
Leopoldina, a cidade mineira onde nasci. Dispunha de todas as virtudes de um
bom sacerdote, além de poeta e senhor de apurada cultura. Tinha lá inspirações
ideológicas que às vezes irritavam os mais conservadores e costumava ser
ranzinza com as noivas. Implicava demais com o tradicional atraso das
“prometidas”.
No horário do casamento – valendo aí, com rigor, o que constava no convite –
estacava-se, paramentado, à frente do altar e começava a conferir,
nervosamente, o relógio. Se a noiva passasse da medida (medida dele) na
charmosa delonga da chegada à igreja, a cerimônia podia ser declarada suspensa:
- Eu tinha, hoje, aqui, um casamento a celebrar, mas, infelizmente, o não
comparecimento da noiva me obriga a agradecer a presença de todos e convidá-los
para a Santa Missa a ser celebrada em seguida...
Um Deus nos acuda! Fazê-lo voltar da sacristia e retomar a cerimônia demandava
esforço diplomático. Lágrimas borravam maquiagens primorosas.
Havia outra área sensível: casamento muito fashion. Ora, se noivas
pobres não podiam ornamentar ricamente a igreja e entrar ao som de acordes de
bom gosto, pompa e luxo deviam ser moderados também nos casamentos da classe
média. Assim, coral do Conservatório, música ao vivo, mimosos arranjos de
flores na (já) suntuosa Catedral, exigiam latim bem declinado para serem
deferidos. Casa de Deus não é lugar de exibição.
Ecce Homo. Possuía, certamente, qualidades que excediam com sobras tais
restrições. Era simpático, apesar de tudo, e pronunciava homilias talentosas
que agradavam. A par da poesia acima lembrada, cultivava também certo pendor
musical, que o levou a compor um belo hino de louvor a Leopoldina. Ele que
nascera em São Sebastião do Paraíso.
Deixei meu interior logo após o ginásio e só pelos trinta anos estive,
pessoalmente, com o Cônego Naves. Na penosa missão, aliás, de advogado de
minha noiva que desejava casar-se ao som de Mozart... Ganhei a causa.
Ele concordou não fazer sentido uma professora de piano caminhar, de véu e
grinalda, até o altar meio a dezenas de convidados com as orelhas na
posição mute.
Mas eis que, meses depois, o encontro no Rio de Janeiro, como protagonista da
história que finalmente passo a contar, ocorrida no prédio do Banco do Brasil
da esquina de Av. Rio Branco com Av. Presidente Vargas.
Via-me ali, certa manhã, enredado em meus misteres bancários, quando reconheci,
no balcão das Ordens de Pagamento, a figura do Pe. Naves. Se querem uma ideia
da pessoa, imaginem o Tancredo Neves vestido de batina. Era ele.
Já o atendia o jovem funcionário, José Breno Monteiro de Castro, também mineiro
de Leopoldina – aliás, da seleta estirpe dos descendentes do Barão de
Paraopeba, de Congonhas do Campo.
Por delicadeza e solidariedade conterrânea, fui apertar-lhe a mão no instante
em que José Breno se oferecia a completar, para ele, o formulário.
- Oh, muito obrigado, meu filho, o remetente serei eu mesmo. Escreva aí,
Gerardo Naves – Gerardo com R, por favor.
Breno estacou:
- Gerardo com R? Mas que coincidência, Cônego! Também o bispo de Leopoldina é
Gerardo, com R!... O nosso querido, Dom Gerardo Ferreira Reis! (Este –
anotação que faço agora – citado por Roberto Campos, no livro “A Lanterna na
Popa”, como seu ex-colega no Seminário de Guaxupé, MG).
Mas seguiu o José Breno:
- Pelo visto, temos então dois Gerardos no Palácio Episcopal
de Leopoldina; o Cura e o Bispo!
Aquiesceu o Cônego naquela entonação pausada e branda dos sermões de domingo:
- É verdade, meu filho. Enorme coincidência. Estamos lá, os dois “Gerardos”, no
mesmo Paço Episcopal e na mesma Igreja ¬ a nossa bela Catedral de São
Sebastião, sede do bispado de Leopoldina. Mas saiba que nos tornamos “Gerardos”
por razões muito distintas! Muito distintas!
- O pai do Senhor Bispo foi homem ilustre, erudito, muito culto mesmo.
Convencido de que Geraldo, o nome que pretendia dar ao filho, teria vindo do
alemão “Gerhard”, optou pela reverência etimológica, batizando a criança como
“Gerardo”.
Já o meu caso foi bem outro, meu filho, muito outro! Meu pobre pai, coitado,
era um modesto tropeiro do Sul de Minas, quase iletrado, que ao dirigir-se ao
Cartório do Registro Civil mal soube pronunciar corretamente o nome que
escolhera para seu moleque. Seria Geraldo, mas ele pronunciou “Gerardo”, neste
nosso sotaque matuto de tantas caçoadas... O escrivão, por literal deboche ou
proximal incultura, assim me registrou: Gerardo, com R.
E arrematou filosófico:
- Donde eu concluo, meu filho, que em muitos casos ignorância e sabedoria se
equivalem.
Sem dúvida, Cônego, sem dúvida.
LISTA DE 66 / 67 - OS DUENDES DA MONTANHA / QUADRO DOS SEMINARISTAS DE
1966 E 1967
Os Duendes da
Montanha, uma opereta escrita pelo Cônego Gerardo Naves [Alberto M. Alves], na
foto, da esquerda para a direita, Eduardo Henriques [Duende do Bem], Anibal
Werneck [Carlos, o protagonista da peça] e Hélio [Duende do Mal], ambos os
duendes estão tentando persuadir Carlos que estava indeciso, não sabia se
ficava na montanha ou descia para a planície.
Os Duendes da Montanha, um teatro cantado e falado, digamos , uma opereta e fez
muito sucesso na época, a estreia foi no Clube Leopoldina, depois foi
apresentada em cidades como, Cataguases, Ubá, Recreio [Associação Comercial] e
outras, no intervalo de uma ato para o outro, o Trio Uirapuru se apresentava,
foi realmente um momento mágico que nós seminaristas vivemos na época.
11.
FESTIVAL
DE VOZES DA JUVENTUDE [Cataguases, 24/11/1963] / VA PENSIERO [Verdi, 1842]
Eis
o ingresso do Coral do Seminário N. S. Aparecida, Festival de Vozes da
Juventude, regido pelo Cônego Gerardo Naves, contendo anexo o Programa das
músicas, divido em três partes: Música Religiosa,
Operística e de
Câmera e Folclórica.
Também, anexo ao
ingresso, os nomes dos componentes do coral, dividido em três vozes: barítonos,
tenorinos e contraltos, cada uma das vozes com o seu regente.
12.
Infelizmente, a única música que eu tenho, sob a sua assinatura, Alberto
M. Alves, é Dona Saudade (vou-me embora), que, pra não perdê-la, eu a gravei um
vídeo com voz e violão e que se encontra no you tube: https://www.youtube.com/watch?v=cDPS65sipcI
13.
Fiz um outro vídeo com est música comemorando um dos nossos encontros de
ex-seminarista e o nosso ex-reitor Pe. Antônio José Chamel: https://www.youtube.com/watch?v=4sBD_oxHWrc
Nota: creio que estas são todas as
informações que tenho sobre o nosso saudoso, Monsenhor Gerardo Naves.